terça-feira, 14 de julho de 2009

Ideias força - cultura

A actividade cultural, mais que a Cultura propriamente dita, é sem dúvida o “calcanhar de Aquiles” das sucessivas administrações municipais. O território físico do concelho é bem delimitado mas o seu “território” de referência cultural não pode e não deve ficar refém dos seus limites físicos pelo que a afirmação regional e nacional de um dado Concelho só se poderá fazer através da capacidade que este tiver de se afirmar culturalmente.

A qualidade e intensidade da oferta da actividade cultural de uma dada cidade são, porventura, um dos elementos mais relevantes na escolha de um destino de férias ou mesmo na fixação de populações, sobretudo nos estratos mais exigentes e qualificados. Neste sentido o investimento nas actividades culturais é sem dúvida, o investimento mais seguro do ponto de vista de um desenvolvimento sustentado para o futuro.

A actividade cultural é, por outro lado, uma actividade em crescimento já que tem um insignificante impacto em termos ambientais e porque será, cada vez mais, considerada como um bem de consumo essencial em sociedades cada vez mais ociosas mas naturalmente mais exigentes e envolvidas civicamente. O acesso à cultura é, porventura, também o veículo mais eficaz no combate às desigualdades e promove eficazmente a integração das comunidades mais desfavorecidas.

Naturalmente que, mesmo reconhecendo que a promoção de actividades culturais só dificilmente não será deficitária, é necessário pensar na sua sustentabilidade futura. Esta sustentabilidade passa naturalmente pela existência de condições físicas e materiais adequadas para a sua implementação e pela capacidade de, pelo menos a prazo, gerar um público consumidor.

Parte da questão das condições físicas ficará resolvida com a construção do Coliseu pelo que o investimento na criação de públicos é uma das tarefas mais importantes que deveremos prosseguir. Esta questão tem naturalmente dois aspectos essências: o primeiro relaciona-se com a absoluta necessidade de ter uma programação regular e de qualidade amplamente divulgada dentro e fora do concelho que permita criar hábitos de consumo; a outra prende-se com o estímulo permanente à capacidade criativa e organizativa dos cidadãos.

Desta forma a programação regular e de qualidade de espectáculos e outras manifestações artísticas contribui, de forma decisiva, para que localmente apareçam também vontades criativas que será necessário apoiar para que se possam desenvolver ainda que mais em termos de condições físicas e materiais do que financeiras. Por seu turno, o aparecimento e desenvolvimento de actividades de iniciativa local contribuem fortemente para a criação de públicos consumidores de cultura o que poderá gerar uma forte dinâmica cultural no tecido social da cidade com todas as consequências positivas para os sectores económicos nomeadamente o turismo.

O estímulo à criatividade e iniciativa individual deverá ser necessariamente ecléctico ainda que deva ser dada especial importância às iniciativas enraizadas nos aspectos da cultura local já que se há uma marca indissociável de Viana do Castelo em termos nacionais esta é, naturalmente, a sua etnografia e todos os aspectos que a envolvem nomeadamente: a música, a dança, os trajes, o ouro e a gastronomia. Esta herança preciosa deverá ser naturalmente preservada mas também explorada e desenvolvida sob novas perspectivas de modo a constituir-se como um estímulo à permanente criatividade para que não corra o risco de se converter numa mera herança do passado sem presente nem futuro.

Propostas:

Dotar a cultura de um orçamento capaz de referenciar Viana do Castelo no contexto cultural regional:

Contratação de um Programador credenciado, com esse objectivo que disponha de um orçamento e metas calendarizadas.

Incrementar os espectáculos de animação de rua, especialmente no centro Histórico, durante o período de Verão.

Fomentar actividades com os jovens, nos museus da cidade, tornando-os um espaço vivo e aliciante para os mesmos.

Criação de uma Academia das Artes no centro histórico que permita: Fazer o repositório do património etnográfico, artístico, musical e da dança e simultaneamente crie condições para o seu desenvolvimento e natural evolução.

Proporcione espaços e condições para as organizações locais possam realizar ensaios eventos e ateliers. Se constitua um pólo dinamizador do artesanato urbano de raiz e inspiração regional.

2 Comentários:

P. Morais disse...

(1a parte) Sou um apoiante do Bloco de Esquerda e sigo com muita atençao as actividades culturais desta cidade. Penso efectivamente que é um dos pontos negativos da anterior presidência de Defensor Moura. Não tanto pelo investimento na criação de novas estructuras, que me parece positivo, mas na gestão destes espaços, que é um verdadeiro desastre.
Esta crítica dirige-se em particular ao facto de um equipamento como o Teatro Municipal Sá de Miranda, que é central para a cidade e integra a Rede Nacional de Teatros, nunca ter tido um cargo de direcção artistica. Se obversarmos dois casos interessantes de gestão de espaços culturais deste mesmo tipo em duas outras cidades da Região, o Teatro Circo de Braga e o Centro Cultural Vila Flor de Guimarães, é possivel observar o salto notável em termos de público e de qualidade da programaçao, depois que foram nomeadas pessoas competentes para os dirigir. Esta questão depende também da clareza com que se effectuam estas nomeações, que devem no meu entender, ser objecto da abertura de um concurso nacional para o cargo com uma análise do projecto dos candidatos. Esta é a única forma de sair dos clientelismos locais e o Bloco tem de ter a coragem de afirmar esta transparência.

Em relação a este programa cultural do Bloco, as minhas dúvidas começam desde logo com a associação cultura-turismo, que me parece uma visao instrumentalizada e mercantil da cultura para um partido de esquerda. Essa percepção da cultura é a mesma que tem desde sempre governado Viana, concentrando os orçamentos na Romaria, e esquecendo que o desenvolvimento e enriquecimento dos publicos é fruto de uma actividade pedagógica sustentada e de fundo, desenvolvida durante todo o ano. É essa visão puramente opurtunista da cultura dirigida ao turismo que fez com que imensos jovens de sucessivas gerações tenham desertado a cidade e desde logo, o contributo para o seu desenvolvimento económico.

Também fico alarmado com a linguagem por vezes utilisada neste programa, ao associar a cultura a "um bem de consumo" ou ao querer substituir um sistema de apoios (se entendermos que a cultura é um serviço público) pelas flutuações da procura ("gerar um publico consumidor", como está escrito), que todos sabemos é bastante reduzida se não for estimulada por uma politica volontarista. Neste ponto, penso que o Bloco está a reagir às criticas populistas dirigidas ao sistema de subsídios à cultura, quando eu espero dele uma outra coragem.

As vossas proposições concretas parecem-me vagas. A partir do momento em que a cidade já está suficientemente dotada de equipamentos, o que é necessário e urgente está relacionado com os orçamentos disponibilizados, as direcções artísticas destes mesmos e o apoio à mediação e sensibilização das actividades.
Outras questões não abordadas estão relacionadas com a plena integração do Teatro Municipal na Rede Nacional de Teatros, nomeadamente em relação à mobilidade dos espectáculos entre eles e à descentralização cultural das companhias, espectáculos e concertos esmagadoramente concentrados nas duas grandes cidades do país. Mas também na possibilidade de integrar em Viana uma escola superior ligada ao domínio das artes, permitindo por em prática uma politica mais articulada entre a cultura e o sector educativo.
Falta ainda uma direcção artistica interessante para um espaço de exposições com abertura para experiências inovadoras, que poderia perfeitamente ocupar o Edifício Távora da Praça da Liberdade (onde teve lugar "Lá fora", uma das raras iniciativas interessantes do género a ter lugar em Viana estes ultimos anos, e a única com repercursões nacionais).

P. Morais disse...

(2a parte) No que respeita às actividades de iniciativa cidadã, penso que uma política de esquerda tem de afirmar claramente que é necessário apoiar financeiramente algums projectos que emanam de associações culturais, permitindo que estas possam sair dos limites do voluntariado. É o caso, por exemplo, dos Encontros de Cinema organizados pelo cineclube Ao Norte, que não sendo suficientemente apoiados, não encontraram uma espeficidade que permita de os destacar ao nível nacional. Observem-se melhor os casos bem sucedidos do festival de curtas-metragens de Vila do Conde ou os Encontros de Cinema Documental de Serpa, que se transformaram em referências tanto para o público como para os profissionais ao nivel internacional.

O ultimo aspecto do programa que me parece problemático tem a ver com uma certa visão regionalista da cultura que tem os seus alicerces no Estado Novo. Quando o Bloco pensa defender o património de uma certa "identidade regional", repare-se que utiliza a mesma linguagem dos saudosistas e, curiosamente, dos prospectos tourísticos que nos vendem um certo exotismo. Ora, uma cidade inventa-se pela cidadania, ou deveria inventar em permanência o espaço comum de vivências e experiências colectivas, em vez de tentar de viver de rendas tourísticas ou pretensas heranças regionalistas. O património das vivências colectivas de uma população tem constantemente de ser alargado se não quiser transformar a cidade num museu.

Uma visão aberta e dinâmica da etnografia deveria já ter integrado aspectos não só ligados ao vestuário, ao artesanato (que entretanto se tornou uma industria) ou à gastronomia, mas também à história social e politica das diferentes lutas colectivas por um futuro diferente e melhor. Quem se interessou até aqui aos movimentos anarco-sindicalistas e socialistas do início do século XX em Viana (de que fazem parte Manuel Fiuza Júnior ou as revendicações por um Estado laico), dos movimentos de resistência ao fascismo, das lutas sindicais dos Estaleiros Navais, dos projectos de habitação social da cooperativa Capitães de Avril e da efervescência cultural e associativa que surgiu depois da Revolução de Avril? Estas dinâmicas também fazem parte de uma visão alargada da história social da cidade, mas tratam-se de movimentos de ruptura e transformação e não de estratégias de preservação e conservação de uma identidade passiva.
Cordialmente,
P. Morais

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